Matérias-primas de uma cerveja
- botecodasabras
- 22 de jan. de 2018
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Genericamente, define-se por cerveja uma bebida carbonatada, de baixo teor alcoólico e elaborada com água, malte de cevada, lúpulo, e complementos (ou adjuntos) como o arroz, o milho ou o trigo, utilizando-se levedura como agente de fermentação (ALMEIDA e SILVA, 2005). A seguir são apresentadas de forma geral as características de cada matéria-prima necessária para a obtenção de uma cerveja de boa qualidade.
Água
Segundo MADRID (1995), entre as matérias-primas mais importantes dentro de um processo cervejeiro está a água, isto devido a sua grande participação como constituinte do produto (em geral acima de 93%). Sendo assim, as suas características físicas e químicas serão de fundamental importância para se obter uma cerveja de boa qualidade. Sua importância é tanta que ela pode ser um dos fatores decisivos na escolha do local para a instalação de uma cervejaria, pois para determinadas correções serão necessários tratamentos minuciosos, o que resulta em aumento no custo do produto final (PRESTES e CORDEIRO, 2008).
Um controle sobre o pH da água é fundamental, pois um pH alcalino poderá ocasionar a dissolução de materiais existentes no malte e nas cascas, que são indesejáveis no processamento. O ideal é que se tenha uma relação ácida facilitando maior atividade enzimática, com um consequente aumento no rendimento de maltose, e um maior teor alcoólico. Em geral, um bom pH para a água que será usada para a obtenção de cerveja está entre 6,5 e 7,0, mas torna-se importante salientar que o tipo de cerveja e processo em muitos casos irão determinar o valor do pH a ser aplicado (AMBEV, 2010; VENTURINI-FILHO, 2010).
Malte
Fonte de amido, proteínas e sais minerais ao processo cervejeiro, o malte de cevada é um produto oriundo da cevada germinada em condições específicas de umidade, temperatura e aeração. É do malte de cevada que é obtido o sabor adocicado bem como grande parte do aroma cervejeiro, o qual varia segundo o tipo de malte utilizado (café, amêndoa, chocolate amargo, entre outros). Além disso, o malte é a matéria-prima fonte das enzimas para a sacarificação, sendo as amilases as principais enzimas contidas no malte.
Como exemplo, podemos citar a α-amilase que é formada durante a germinação e age sobre o amido cru e gelatinizado possuindo pH ótimo entre 5,7 e 6,5 e temperatura ótima entre 60ºC e 75ºC. Um outro exemplo é a β-amilase, presente no grão antes de sua germinação, seu pH ótimo é 4,5 e sua temperatura ótima varia entre 40ºC e 65ºC. Na presença destas enzimas e de outras é que no decorrer do processo de preparo do mosto cervejeiro vai ocorrer a sacarificação, que é a transformação do amido em açúcares redutores, maltose e dextrinas. A quantidade formada irá depender da concentração de amido no grão de malte, do tempo da reação enzimática, do pH do meio e da temperatura (LOSS, 2006). No Brasil, as indústrias cervejeiras preferem não utilizar malte de uma só procedência, mas sim, uma mistura de diversos maltes com o objetivo de obter um mosto mais padronizado (AQUARONE et al., 1993).
Lúpulo
O lúpulo é uma planta dióica da família das Cannabinaceae. De acordo com Hornsey (1999) a espécie comumente utilizada nas cervejarias é o Humulus lupulus. Seu cultivo é realizado em regiões de baixas temperaturas no hemisfério norte. Os principais produtores são os Estados Unidos e países do norte da Europa. Devido ao clima tropical do Brasil não há condições de plantio de lúpulo em nosso território e toda a demanda para produção deve ser importada. (HUGHES e BAXTER, 2001). Somente a cerveja entre as bebidas alcoólicas possuem lúpulo em sua formulação. (HORNSEY, 1999).
É nas flores femininas da planta, que se encontra a lupulina, substância responsável por conferir aroma e amargor característicos da cerveja. Devido a presença de iso-alfa-ácidos o lúpulo possui ainda propriedades antibióticas e bacteriostáticas e contribui para a formação da espuma e a estabilidade de sabor da bebida (BOTELHO, 2009). O lúpulo é vendido em flores secas (BRIGIDO, 2006) ou na forma de pó, pellets ou extrato (CRUZ, 2008). De acordo com Nogueira (2006) a forma mais comum de comercialização do lúpulo é em pellets onde ocorre a prensagem de suas flores. Com isso consegue-se reduzir o volume transportado ao mesmo tempo em que se conservam as características originais das flores.
Há basicamente três variedades de lúpulo: a que confere aroma (exemplos - Hallertau, Spalt e Lublin), aquela que confere amargor (como o Target, Galena e Nugget) e, por fim, a variedade que atribui as duas características - aroma e amargor citando o Perle, o Centennial e o Chinnok. O teor de alfa-ácidos é determinante pelo poder de amargor do lúpulo. Dessa forma, lúpulos que conferem aroma possuem menor teor alfa-ácidos que aqueles que acrescentam amargor a bebida. A terceira variedade, por sua vez apresenta elevados teores de alfa-ácido e também beta-ácidos. (NOGUEIRA, 2006). González-Gross e colaboradores (2001) descreveram os principais constituintes do lúpulo, além da água: resinas, óleos essenciais e polifenóis.
Os óleos essenciais, assim como as resinas, são provenientes da glândula lupulina e contribuindo para o aroma da cerveja. Em sua constituição apresentam sesquiterpenos, monoterpenos, álcoois, ésteres, cetonas aldeídos e ácidos carboxílicos (Hornsey, 1999). As resinas podem ser divididas em moles, que apresentam os alfa-ácidos (humulona, cohumulona, adhumulona) e beta-ácidos (lupulona, colupulona e adlupulona) e duras, que possuem alfa e beta-ácidos oxidados; Dentro da gama de polifenóis (citamos ácidos fenólicos, chalconas, flavonóides, catequinas e proantocianidinas). Os flavonóides merecem destaque, pois são responsáveis por uma série de propriedades bioativas, propriedades sedativas, estrogênicas e anti-cancerígenas.
Levedura
As leveduras, ditas como agentes de fermentação, mais utilizadas em cervejaria são de duas espécies do gênero Saccharomyces: Saccharomyces cerevisiae (alta fermentação) e Saccharomyces uvarum (baixa fermentação) (BRIGIDO e NETO, 2006).
Hoje, já foram catalogadas mais de 2.800 espécies de leveduras, separadas em quase 80 gêneros, mas dessas, somente 4 são próprias para a fabricação de cerveja.
Saccharomyces cerevisiae
Produzem as cervejas do tipo Ale;
São as leveduras cervejeiras originais;
Se concentram e atuam no topo do fermentador;
Possuem grande variedade de cepas.
Saccharomyces uvarum
Produz as cervejas tipo Lager;
Se concentram no fundo do fermentador e decantam após a fermentação;
Possuem variedade de cepas limitada, produzindo uma gama menor de cervejas.
Brettanomyces sp
B. bruxellensis: Excelente para refermentação e utilizada na trapista Orval, produz aromas característicos de média intensidade;
B. lambicus: Produz as cervejas lambic, Flanders Red Ale, e apresenta aromas animalescos inusitados, como cavalo, condimentados em alta intensidade, como cravo e pimenta preta, além de couro, estabulo, cavao, celeiro;
B.anomalus: Menos famosa que os outros exemplares, foi isolada pelos ingleses. Apresenta aromas mais sutis, com toques frutados que podem remeter abacaxi. Parte essencial de cervejas como a lambic, mas também utilizada para obter novos aromas e sabores em cervejas do estilos como Saison, Belgian Pale Ale e até India Pale Ale .
Saccharomyces bayanus
Usada em champanhes, também é utilizada para fermentar lentamente cervejas mais alcoólicas.
Adjuntos
São chamados de adjuntos as fontes de carboidrato que venham a ser utilizadas com o objetivo de substituir parcialmente o malte na produção de cerveja (MORADO, 2009). Visando basicamente a redução de custos com a matéria-prima muitos países, incluindo o Brasil, substituem parte do malte de cevada por outros cereais. Além disso, a cerveja produzida com estes compostos é em geral mais leve e suave quando comparada aquelas obtidas exclusivamente pelo malte de cevada. Tecnicamente é possível produzir cervejas com apenas 5% de malte e 95% de adjuntos desde que sejam incluídas na formulação enzimas fornecidas industrialmente para compensar aqueles presentes naturalmente no malte de cevada. (HORNSEY, 1999).
Ainda segundo o autor, países como os Estados Unidos produzem cerveja com até 60% de adjuntos. Por outro lado, na Europa, onde a fabricação é mais conservadora, dificilmente encontramos cerveja com mais de 40% de adjuntos. Na Alemanha e na Grécia, países onde aplica-se a lei a pureza da cerveja, toda a fonte de carboidratos deve-se exclusivamente ao malte de cevada, com exceção das cervejas de alta fermentação (GARCIA, 2012).
A legislação brasileira autoriza a utilização de adjuntos na produção de cerveja, entretanto, limita a adição de açúcar em 10% a 15% em relação ao Extrato Primitivo (EP) nas cervejas claras e até 50% em relação ao EP nas cervejas escuras (BRASIL, 1997). Hornsey (1999) destacou o grits de milho, o arroz partido, o trigo, a própria cevada e o xarope de milho como os adjuntos mais utilizados nas cervejarias.
Este texto foi extraído do Trabalho Final do CURSO DE TECNOLOGIA EM PROCESSOS CERVEJEIROS da aluna Sabrina Pinheiro (autora desse site www.botecodasabras.com.br).
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